Todos passamos por isso. Aquele momento misterioso, encantador, quando enxergamos a musa inspiradora. A criatividade é frenética. Infelizmente, ela também é inconstante: quanto mais persegui-la, mais difícil de alcançá-la.
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Ninguém sente mais essa tensão do que aqueles que vestem o título de “profissional criativo”. Seja qual for sua veia artística – designer, escritor, músico, desenvolvedor – a questão é: o que você faz quando o poço seca? Mais precisamente: o que você faz quando sua energia, suas horas e seus recursos estão, lentamente, diminuindo?
Quando se trata de criatividade, o problema fundamental é que a maioria de nós a procura nos lugares errados. Mas não se sinta mal. Essa desorientação não é necessariamente sua culpa. Por isso, criamos esta lista com os sete erros mais comuns que cometemos e como podemos potencializar nossa criatividade.
Você é original demais
Infelizmente, com uma população de mais de 7 bilhões mundialmente, é possível ter uma ideia de algo que não existiu antes? Provavelmente não. Mas não se desespere: para a criatividade, a originalidade é superestimada. Nosso próprio Adam Pash afirma isso:
Não é o fim do mundo se você não consegue ter uma ideia verdadeiramente original.
Provavelmente você só está sendo sincero consigo mesmo.
Abrace o que você sabe, pegue o que melhor funcione e junte com outras ótimas ideias para criar algo que, apesar de não ser necessariamente original, seja novo e interessante.
Em outras palavras, a criatividade não vem do que é completamente novo ou desconhecido. Frequentemente, ela começa com o que você já sabe e adiciona um novo ângulo ou combina isso com uma ideia fresca.
A palavra “combinar” é vital: analisando a genialidade criativa de Picasso e da “designer icônica Paula Scher”, Maria Popova explica:
Ambas histórias captam algo que todos nós entendemos a nível intuitivo, mas nossos egos criativos não aceitam: E essa é a ideia de que a criatividade é combinatória, que nada é inteiramente original, que tudo é construído sobre o que veio antes e que nós criamos ao pegar pedaços de inspiração existentes, conhecimentos, habilidades e ideias que tivemos ao longo da vida e recombinamos tudo em incríveis novas criações. O ponto é: não comece sua jornada criativa em um mapa isolado. Comece com pessoas, lugares e ideias que te inspiram e nunca tenha medo de “roubar”.
Você é isolado demais
Ser “isolado” é outro erro contra-intuitivo que muitos de nós somos vítimas também. Muitas vezes, consideramos a criatividade como uma busca solitária e independente. Nos imaginamos sendo Bob Dylan, em 1965, fugindo do centro das atenções, escapando para uma pequena cabana em Woodstock e surgindo com “Like a Rolling Stone” inteiramente pronta.
De acordo com o cineasta Kirby Ferguson, a realidade está longe disso. Na verdade, somos totalmente dependentes uns dos outros para quase tudo. Como Ferguson diz: “Nossa criatividade vem de fora, não de dentro”. Isso significa que planejar seu processo criativo em torno da colaboração é essencial.
Surpreendentemente, a colaboração tem sido essencial até para alguns dos solitários mais notórios da história. Como Joshua Wolf Shenk disse ao NPR:
Para mim, uma das histórias mais fascinantes é a de Emily Dickinson, que pensamos ser totalmente isolada, sozinha em seu quarto, recusando deixar a casa de seu pai o que, de fato, era o caso. Mas ela era extremamente enredada nas pessoas, não do tipo comum da colaboração “dar e receber” – duas pessoas sentadas em uma sala – mas do tipo que escrevia cartas e realmente escrevia seus poemas para pessoas particulares. Ela enviou centenas de poemas para as pessoas que a criticavam em vida. E sua poesia era viva e com relativa paixão – era elétrica.
E a Emily não está sozinha (piada intencional). A verdadeira genialidade criativa raramente vem do “eu”, ela quase sempre vem de “nós”. Citando pares famosos como Steve Jobs e Steve Wozniak, em seu livro The Innovators: How a Group of Hackers, Geniuses, and Geeks Created the Digital Revolution, Walter Isaacson enfatiza:
A maioria das inovações da era digital foram feitas colaborativamente. Houve muitas pessoas fascinantes envolvidas, algumas engenhosas e até alguns poucos gênios. Isto é… uma narrativa de como eles colaboraram e por que suas habilidades de trabalharem como equipe os tornaram ainda mais criativos.
Qualquer que seja o método que você adote, da próxima vez que estiver sofrendo de falta de criatividade, entre em contato, peça conselhos, busque diferentes opiniões e confie em seus contatos para começar.
Você é distraído demais
Em sua apresentação no TEDx, Nick Skillicorn distingue entre os dois estágios iniciais da criatividade, em ambos o cérebro precisa alcançar a “inspiração”. O primeiro estágio é a preparação, que ele descreve como “absorver conhecimento, experiência, visão e contexto, bem como compreender o desafio específico que exige uma ideia”. Apesar das distrações serem importantes mais tarde, a criatividade tem que começar com foco.
Para se livrar das distrações, um estudo feito pela Universidade Leiden sugere que meditar sobre um problema estimula a criatividade através do “pensamento divergente”. Além da meditação ser capaz de reduzir os níveis de estresse, a prática da atenção plena também pode reduzir a rigidez cognitiva: a incapacidade de se adaptar a novos estímulos, problemas ou tarefas. O objetivo tanto da meditação quanto da atenção plena é criar flexibilidade cognitiva, que leva a “estar no astral”.
Não espere que grandes ideias se materializem em um instante. A criatividade exige trabalho e, por vezes, a melhor maneira para ser criativo é olhar atentamente para o que está te bloqueando.
Ao invés de esperar que uma ideia apareça magicamente, seja disciplinado. Encaixe o tempo de preparação na sua agenda, mergulhe na pesquisa, faça o trabalho pesado e transcreva seus pensamento no papel. Somente após encher o cérebro que as novas ideias começam a fluir.
Você é focado demais
Ironicamente, nossas melhores ideias vêm nas horas mais estranhas: seja ao acordar às 3 da madrugada, durante a academia ou no chuveiro.
Por que? Porque uma vez que seu cérebro esteja acumulado de preparação, ele começa a trabalhar por trás das cenas para criar ligações entre os problemas e as soluções sem você perceber.
Isso é o que Skillicorn chama de fase da “incubação”: o “tempo necessário para sua mente formar novas conexões”. Ser “focado demais” significa cair na armadilha de tentar forçar a criatividade. Ao invés disso, incentive a “incubação” abraçando distrações.
Pesquisadores da Universidade de Northwestern recentemente concluíram que a criatividade pode ser realmente conduzida pela distração. Eles chamaram os resultados do seu estudo de “a primeira evidência fisiológica de que a criatividade do mundo real pode estar associada com a redução da habilidade de filtrar informações sensoriais irrelevantes”. Darya Zabelina, autora principal do estudo, explica que “alguma pessoas são mais afetadas pelo bombardeamento diário de informações sensoriais – ou têm filtros sensoriais que “vazam”:
“Vazamento” sensorial, a propensão ao filtro de informações sensoriais “irrelevantes” começa cedo e involuntariamente no processamento cerebral e pode ajudar pessoas a integrarem ideias que estão fora do foco de atenção, o que leva à criatividade no mundo real.
Isso significa que sair periodicamente é vital para o processo criativo. É difícil estimar o valor da distração, tédio e procrastinação para a criatividade e, quando se está focado há muito tempo, talvez seja melhor fazer uma pausa.
Você está apaixonado demais
Uma vez que laçamos uma ideia criativa, é natural que nos apaixonemos por ela. Apesar de ser crucial acreditar em seus bebês nos estágios iniciais do desenvolvimento, esse caso de amor pode ser desastroso no futuro. Na famosa palestra de Sir Arthur Quiller-Couch em Cambridge, “Sobre a Arte de Escrever”, ele estabelece este violento imperativo:
Sempre que você sentir o impulso de perpetrar uma escrita excepcionalmente bela, obedeça – de coração – e apague antes de enviar seu manuscrito para a impressão. Assassine seus queridinhos.
A lição aqui é óbvia: se apaixonar por suas ideias, defendê-las e ser relutante em deixá-las ir não aumenta a criatividade, só a inibe.
Durante a produção de The Road, Nick Cave deu essa dica valiosa para o The LA Times:
Para uma música que tenha cinco ou seis versos, eu escrevo 20 versos e, então, corto, corto, corto. Sempre foi assim. Não posso lançar algo até que esteja esgotado, então eu tenho que editar. Estou sempre editando. Acho a edição incrivelmente excitante. Retirar algo de algo pode criar coisas extraordinárias, seja na música ou escrevendo para um filme. Em filmes, é extraordinário o que acontece.
Claro, você pode forçar uma bela peça de quebra-cabeça até encaixar em algum lugar incorreto e, talvez, isso faça você se sentir melhor por um tempo. Mas forçar desse jeito causa mais trabalho e arrependimento no fim. Ao invés disso, deixe a peça – ou seja, a ideia que você tanto ama – de lado e espere até o momento certo para usá-la ou executá-la completamente. Como meu professor favorito de escrita criativa me disse ma faculdade: “Você só sabe que algo está ficando realmente bom quando começa a fazer cortes, e isso dói”.
Você é perfeito demais
Por anos minha esposa fez palavras cruzadas. Na verdade, “fez” é um termo muito leve. Ela as devorou. A única razão dela comprar o jornal era por causa das palavras cruzadas do The New York Times. Por mais envergonhada que ela tenha ficado ao me dizer isso, na realidade ela levou dois anos até completar sua primeira palavra cruzada.
O que a impediu?
Perfeccionismo. “Eu olhava aquelas palavras cruzadas ¾ concluídas e ficava frustrada comigo mesma pois não conseguia descobrir “tudo” de uma vez. Sentia que elas eram algo que eu tinha que ser capaz de fazer. Eu começava cada uma em um turbilhão criativo. Mas a cada erro, o quadrado branco olhava para mim, me acusando. Somente após eu largar minhas expectativas – minhas próprias necessidades de acertar e ser perfeita – que eu finalmente tive um grande avanço”. Daquele ponto em frente, as palavras fluíram.
O que é verdadeiro para ela é igualmente verdadeiro para você. Não imagine se sentar e se tornar o próximo Steve Jobs, Claude Monet ou Will Shortz. A maioria de nós temos que alimentar nossa criatividade, utilizar nossas forças e aprender a trabalhar dentro de nossas fraquezas.
Na face do perfeccionismo, permita-se falhar. Em Criatividade S/A, o presidente da Pixar Ed Catmull descreve:
É uma afirmação brusca, eu sei, mas escolhi essa frase porque dizê-la de modo mais suave falha em transmitir o quão ruim as primeiras versões realmente eram. Não estou tentando ser modesto ou discreto.
Os filmes da Pixar não são bons no início e nosso trabalho é fazer isso – ir, como digo, “do ruim para o não-ruim”.
Esqueça o velho ditado “qualquer coisa que vale a pena fazer, vale a pena fazer certo”. Besteira. Qualquer coisa que vale a pena fazer, vale a pena fazer mal, especialmente se você quer ser criativo.
Você é aleatório demais
Criatividade tem a antiga fama de ser reservada para aqueles com “tempo e meios”. Imaginamos os grandes criadores da história, especialmente aqueles com uma veia artística, como criaturas etéreas, iluminadas, flutuando sem rumo pela vida, inatingíveis pelas demandas e restrições que o resto de nós temos que enfrentar.
Como resultado, imaginamos que a criatividade é o resultado da peregrinação sem rumo: dar nossas mentes e vidas ao livre fluxo do universo, ou algum aforismo assim. Tolice. Steve Jobs melhor disse: “Real artists ship” (velho ditado na Apple Computer que significa que é realmente importante entregar).
Apesar da “incubação” ser essencial para o processo criativo, metas concretas são a essência primordial. Masaaki Hasegawa, autor de Yes Progressive – Acceleration in Creativity descreve a importância das metas sucintamente:
Metas fazem você entender o que tem e o que precisa, conectando todos os pontos interna e externamente, a fim de alcançar essas metas.
Se você não tem objetivos, metas ou direções específicas para usar sua criatividade, não tem sentido ser criativo. Seja no campo dos negócios, arte, política ou esporte, você será criativo quando tiver metas específicas.
Entretanto, uma vez que nos desiludimos da noção de que a criatividade requer ausência de rumo, o próximo problema que enfrentamos é – como Hasegawa salienta – definir metas “específicas”.
Vá em frente em comece a aplicar as lições agora mesmo. Quem sabe, talvez você seja capaz de encerrar seu período de seca e voltar a criar.
Texto originalmente publicado por Sam Woolley no site LifeHacker. Traduzido e adaptado pela equipe do Tutano.
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